1993-2021: Relembre a icônica trajetória do Daft Punk

Daft Punk em 'Random Access Memories' | Columbia Records

Desde que começaram a produzir música em seu quarto sob o nome de Darlin', Guy-Manuel de Homem Cristo e Thomas Bangalter nunca poderiam pensar nas proporções que sua música tomaria ao assumir o codinome e as faces robóticas do Daft Punk.

Depois de 28 anos, o duo encerrou publicamente sua parceria com um trecho de seu curta-metragem, 'Electroma', lançado em 2006, acabando com as teorias e a espera de oito anos dos fãs para um novo projeto desde de seu aclamado álbum, 'Random Access Memories', que ganhou o Grammy em 2013.

Para celebrar ("c'mon, alright, we're gonna celebrate!"), vamos relembrar alguns dos hits (e algumas mais) que fizeram os carismáticos robôs se tornarem um dos principais nomes do movimento house music, do french touch e do que se seguiria no que chamamos hoje de música eletrônica. 

Daft Punk para a Pitchfork | Pitchfork

1- One More Time (Discovery, 2001)

Conhecida por colocar a dupla nos holofotes do mundo inteiro, 'One More Time' invadiu as rádios em 2001 ao ser lançada como single para o seu segundo álbum.

A enérgica e festiva música cantada por Anthony Moore (produtor musical mais conhecido como Romanthony) nasceu de uma mensagem sobre desafiar o cansaço e continuar dançando, inspirada no filme 'A Noite dos Desesperados' de 1969. Ela também faz parte - junto aos outros clipes dos singles - do anime 'Instertella 5555', que serviu como uma obra visual de todo o álbum 'Discovery'.

Foi também uma crítica a polêmica sobre o surgimento de músicas que usavam da prática do auto-tune, usando bastante da técnica nos vocais de Romanthony. 

Alguns anos depois, a faixa seria nomeada a diversos prêmios e nomeações, como uma das Melhores Músicas Dance de Todos os Tempos (Mixmag), das 500 Melhores Músicas de 2000 (#5 pela Pitchfork) e das 100 Melhores Músicas da Década (#33 pela Rolling Stone), entrando pra história como um grande hit, sendo impossível deixar de cantar seu refrão aonde ouvir.

One More Time | Parlophone 

2- Around The World (Homework, 1997)

A dupla de robôs conseguiu marcar uma identidade ao mostrar músicas repetitivas, que conseguiam hipnotizar muito bem qualquer um que dançasse com as mesmas, familiarizando esse tipo de produção nas pistas de dança e até mesmo nas rádios do mainstream. O maior exemplo disso, vem de 'Around The World', numa época onde seus capacetes robóticos nem faziam parte de sua identidade.

O título, dito mais de 100 vezes em looping na música inteira é coberto por uma linha de baixo funk bem gostosa de se ouvir e de sintetizadores bem eletrizantes, impossíveis de não mexer o pé ouvindo.

Sendo já de seu primeiro álbum intitulado Homework (por ter sido feito inteiramente em casa), 'Around The World' já atingia o mundo, sendo #1 nas dance charts mundiais. Também chegou a ser usada como base para covers e trilha sonoras de vários tipos e produções.

Around The World | Parlophone 

3- Harder, Better, Faster, Stronger (Discovery, 2001)

Daft Punk se provou saber reconstruir músicas. Foi assim com diversas faixas de seus primeiros discos, usando samples e trechos de outras músicas dos anos 60, 70 e 80 e tornando-as quase irreconhecíveis sob a nova roupagem que tomavam nas batidas house incorporadas.

Aqui, os robôs usaram como base a música de 1979 'Cola Bottle Baby' de Edwin Birdsong, além de ser toda influenciada por shows da década também.

A composição característica do Daft Punk segue-se também por aqui. É bem funk, dançante e segue apenas vocais robóticos dizendo "work it harder, make it better, do it faster, make us stronger (...)". A grande marca da música vem da brincadeira feita com os vocais e com os versos, parando-a, alterando tons e o jeito que se seguem, soando quase como um instrumento do que vocais em si, e guiando a música entre o dance, o funk e o hip-hop.

Seu jeito inóspito se tornou tão icônico, que foi feito um vídeo chamado 'Daft Hands' que viralizou na internet em 2007, na qual o autor escreve a letra da música nas mãos e 'dança' com elas em uma divertida espécie de 'lyric video'. Seu famoso refrão também foi inserido por Kanye West na sua música 'Stronger', lançada no mesmo ano.

A música viria a ser aclamada justamente pela sua simplicidade, movimentando a música pop de um jeito que só o Daft Punk consegue fazer.

Daft Hands (fan-made video) | Parlophone

4- Technologic (Human After All, 2005)

Se a 'Harder, Better, Faster, Stronger' era elogiada pela simplicidade, aqui, ela era a pior inimiga do Daft Punk.

Irritante e repetitiva pra alguns, misteriosa e ousada para outros, 'Technologic' é uma virada interessante na reta final de seu álbum de origem, 'Human After All'.

Não é de se impressionar que a mitologia criada por Thomas e Guy-Manuel em torno das duas figuras robóticas envolveria temas sobre tecnologia e ficção. E 'Technologic' evoca muito bem todo o sentimento envolto a grande evolução tecnológica que acontecia desenfreada nos anos 2000. 

Composta de frases que, a princípio, parecem totalmente desconexas e sem sentido algum, começamos a notar junto ao decorrer da música, a grande sacada. Temas como produtos se tornando totalmente descartáveis, a facilidade da tecnologia e o como tudo estava se tornou imediatista, feito na hora. Um contexto que permanece bem atual.

Sua maior característica está em seu clipe, que consiste em uma figura robótica, completamente bizarra e assustadora, cantando enquanto um telão legenda suas frases em um teor de alerta. O vídeo se tornou o mais assistido da era 'Human After All', embora todas as suas críticas. 

Technologic | Parlophone 

5- Get Lucky (Random Access Memories, 2013)

O primeiro single lançado de seu último álbum de estúdio (e de seu mais promissor) deveria carregar o que estaria por vir na nova era do Daft Punk. Felizmente, 'Get Lucky' fez jus ao que se propunha e muito mais. 

Trazendo o ícone do funk e jazz, Nile Rodgers nos riffs de guitarra e Pharrel Williams junto aos vocais, temos um vislumbre do glamuroso ode a discoteca (consequentemente sendo também uma inspiração clara ao som de Rodgers) que veio a ser 'Random Access Memories' (ou RAM, para os íntimos). 

Sua proposta vinha logo depois de terem trabalhado na trilha sonora de 'Tron: O Legado', em 2010, se afastando do house music carregado de samples e nos synthwaves cinematográficos para focar em um funk-pop mais orgânico, tanto em estrutura, como na própria produção, que segundo Thomas, foi o primeiro álbum deles a ser gravado majoritariamente em estúdio. 

Williams conta que, no processo de composição da letra, sua intenção era trazer "uma memória incrível" e evocar esse cenário como uma noite marcante, que deveria durar para sempre. ("we're upon night to get lucky").

A música quebrou as paradas do Spotify logo no dia de seu lançamento, superando diverso recordes. Pharrel conseguiu trazer o seu conceito até mesmo para as rádios, que tocam a 'Get Lucky' em repeat até hoje. 

Get Lucky | Columbia Records

6- Alive (Homework, 1997)

'Alive' entra nessa lista não só pela música em si, mas para o que ela representou para o Daft Punk desde sua primeira tour em 1997, de mesmo nome. A música que reformula todo o conceito de robôs que querem se tornar humanos é instrumental, mas incorpora muito bem o sentimento. 

Já a tour 'Alive 2007', venceu a categoria de melhor álbum eletrônico no Grammy daquele ano, mesmo sendo um álbum ao vivo.

Tanto o álbum, quanto a música, significam bastante na carreira do Daft Punk, por serem marcos definitivos do avanço e dinamismo da dupla e de seu nome no cenário musical.

Alive | Parlophone 

7- Touch (Random Access Memories, 2013)

Para alguns (e pra quem vos escreve), 'Touch' é a melhor música da discografia do Daft Punk e também a mais complexa das faixas presentes em RAM. A dupla a define como o ponto crucial do álbum, não sendo à toa ela estar bem no meio do disco.

Trazendo o grandioso Paul Williams para os vocais, 'Touch' apresenta em oito minutos, uma jornada cinematográfica sobre um computador recebendo pela primeira vez o toque humano e criando sentimentos todos de uma vez. 

O resultado é lendário, bem executado e emocionante. A troca entre gêneros expressa as diversas emoções, como uma festa dentro de um disco rígido, que se sente tão familiar e tão pensante quanto um cérebro humano. 

'Touch' é uma daquelas músicas que ao ouvir, parece sempre a primeira vez, sendo definitivamente inesquecível. 

Touch (clipe fan-made) | Parlophone 

8- Derezzed (Tron: O Legado, 2010)

Impossível falar sobre a trajetória do Daft Punk sem fazer uma menção - e gigantesca - a trilha sonora que eles compuseram para 'Tron: O Legado', definida como uma das melhores trilhas sonoras da década, por fãs e críticos.

Curiosamente, Tron não agradou a crítica e o público quando lançou, não tendo tanto sucesso quanto a Disney procurava obter revivendo a franquia.

Com sua trilha sonora liberada na internet um tempo depois, há relatos de pessoas que voltaram a ter interesse em assistir o filme mais uma vez, criando discussões que perduram até hoje sobre Tron ser ou não um bom filme. 

Vale lembrar que na cena em que 'Derezzed' é tocada, os robôs fazem uma pequena aparição, como DJs em um clube de dança. A música é bem psicodélica e casa bastante com o frenesi da cena e com a estética do filme.

Derezzed - Tron: Legacy OST | Disney

9- Giorgio By Moroder (Random Access Memories, 2013)

Sim, RAM realmente é um álbum cheio de espetáculos musicais, reverenciando a discoteca e os gêneros que fizeram parte das pistas de dança oitentistas. Assim dito, os robôs sentiram a necessidade de criar um tributo a um dos grandes pioneiros dessa era, infiltrado em uma das músicas do álbum.

Com a presença do próprio Giorgio Moroder, a música começa como uma entrevista sobre sua vida e sobre o 'som do futuro' que saia dos sintetizadores, que eram novidade na época. O ritmo se cria a partir disso, com pianos, trompetes, orquestras e um ótimo synthpop psicodélico.

Vale lembrar do meme chamado "My name is Giovanni Giorgio but everybody calls me Giorgio", que viralizou na internet recentemente usando a música como base.

Giorgio By Moroder | Columbia Records

10- Face To Face (Discovery, 2001)

Como já dito, algo muito comum nas produções de house music era o uso de trechos de outras músicas, remixados e remodelados. Essa prática foi logo depois batizada de "sampling", tendo gerado diversos debates sobre ser uma forma válida de criação musical ou sendo uma prática semelhante a um plágio. Um dos precursores dessa discussão foi o Daft Punk.

Tendo diversas músicas explorando essa prática, uma das produções que mais fascinam é 'Face To Face', que usa da arte do sampling de forma totalmente única e quase refutando o argumento invalidando a técnica.

Só pra se ter uma ideia, há samples na música que foram encontrados dez anos depois de seu lançamento, sendo esses um conjunto remodelado dentro da música, que constrói uma melodia esquisita e ao mesmo tempo familiar com as músicas alternativas que dominaram o cenário em 2010.

Composta junto e cantada por Todd Edwards, é mais uma camada do talento da dupla na área da produção musical. 

Face To Face | Parlophone 

11- Contact (Random Access Memories, 2013)

Você já assistiu '2001: Uma Odisseia No Espaço'? Enquanto assistia, você chegou a se perguntar o que exatamente é uma odisseia? 

Em resumo, significa uma jornada de aventura seguida por várias histórias inesperadas. 

Com isso dito, você ja imaginou como uma odisseia sonora funcionaria? Um dos grandes exemplos de músicas mais recentes pode ser 'Contact', última faixa de 'Random Access Memories'.

Ela começa com um sample de 'We Ride Tonight' da banda Sherbet, que assustadoramente nem parece fazer parte de outra música. Uma comunicação da NASA começa a tocar, de um aparente astronauta, relatando um objeto em movimento na qual ele não conseguiu identificar. A partir daí, uma perfeita odisseia de sintetizadores se inicia, remetendo a filmes de abdução, aliens e fantasia. A música termina em um grande clímax, viradas de bateria, sintetizadores bombásticos e efeitos de distorção que arrepiam, dando a sensação de realmente estar flutuando para um grande desconhecido. 

Segundo o próprio Daft Punk, a intenção era remeter grandes finais de concertos de rock, com guitarras gritando e ecoando nos amplificadores até mesmo quando a música acaba. 

Não é uma das mais notadas em sua discografia pelo mainstream. Mas assim como 'Touch', uma das que vale muito a pena ouvir.

Contact | Columbia Records

Devemos também mencionar 'I Feel It Coming' e 'Starboy', as últimas produções feitas pelo Daft Punk e ambas colaborações impecáveis do penúltimo álbum do The Weeknd.

I Feel It Coming | Republic Records

O futuro para o Daft Punk talvez seja incerto, o que é irônico para robôs do futuro que faziam música do futuro. Enquanto isso, ficamos com o seu icônico legado, esperando um - quem sabe - retorno. 






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